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Câmara aprova texto-base da reforma tributária em segundo turno, destaques serão analisados sexta-feira

Tempo de leitura: 11 minutos


O plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na noite desta quinta-feira (6), o texto-base da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que trata da reforma tributária dos impostos sobre o consumo.

No primeiro turno, foram 382 votos favoráveis e 118 contrários, com 3 abstenções, ao substitutivo apresentado pelo relator, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). No segundo turno, foram 375 votos a 113, com 3 abstenções. A sessão foi realizada em regime híbrido, que permitiu aos parlamentares não apenas a votação mas também o registro de presença por meio do aplicativo Infoleg.

Os parlamentares agora se debruçam mais uma vez sobre a análise de destaques apresentados pelas bancadas partidárias, com sugestões para modificação da versão do texto aprovado. A sessão foi encerrada após apreciação de um deles, com expectativa de que os quatro restantes sejam apreciados na manhã de sexta-feira (7) a partir de 10h (horário de Brasília).

Uma vez superada esta etapa da tramitação da matéria, ela segue para o Senado Federal. Por se tratar de PEC, o texto precisa do apoio de 3/5 em todas as votações de mérito nos plenários das casas legislativas. Isso significa um mínimo de 308 votos de deputados e 49 de senadores.

A proposta sofreu significativas modificações durante sua tramitação na Câmara dos Deputados, em meio às discussões e negociações com governadores, prefeitos, bancadas partidárias e distintos setores econômicos. A versão final analisada pelos deputados só foi protocolada pelo relator no sistema alguns minutos antes da votação.

Partidos da base do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) entregaram elevadas taxas de apoio ao substitutivo, mas também contribuíram para o resultado favorável à matéria legendas do chamado “centrão” e da oposição.

Pouco antes de a votação ser encerrada, o presidente da casa legislativa, Arthur Lira (PP-AL), se afastou temporariamente da Mesa Diretora e se dirigiu à tribuna do plenário para discursar a favor da matéria.

Durante sua fala, ele ressaltou o tempo que o assunto vem sendo discutido pelo Poder Legislativo sem que fosse possível chegar a um consenso e pediu que os colegas deixassem de lado posições ideológicas.

“Não há brasileiro feliz com o nosso atual sistema tributário. Todos querem um sistema tributário com justiça social, simplificado e eficiente”, afirmou.

O parlamentar afirmou, ainda, que a votação da proposta nesta noite consagra um momento histórico para o Brasil e para os parlamentares. “Todo o País olha para este Plenário esperando a aprovação de uma reforma tributária justa, neutra, que dê segurança jurídica e promova justiça social”, disse.

Lira afirmou que o texto não deve ser instrumento de barganha política ou batalha político-partidária. Segundo ele, não se trata de uma pauta de governo, mas de Estado. Ele ressaltou que o objetivo final do texto é promover a simplificação tributária e incentivar o crescimento econômico do Brasil.

“A urgência é do Brasil, dos brasileiros que precisam de mais emprego, de mais renda e menos impostos; e dos empresários de todos os setores da economia, que querem um sistema tributário racional, equânime, justo”, afirmou.

Já o relator Aguinaldo Ribeiro afirmou que a PEC vai reestruturar a economia brasileira. “Estamos querendo tão somente construir um país. Não é um país que olha para a direita, não é um país que olha para a esquerda, mas é um país que olha para frente, que pretende deixar de ser o país do futuro para ser o país do presente”, disse.

A reforma tributária, segundo ele, vai iniciar um processo de desenvolvimento econômico ao dar segurança jurídica ao setor produtivo. “O que nós queremos de verdade é um país mais justo, um Brasil mais rico e que possa distribuir riqueza. Um país que desonere a produção, que traga competitividade e que gere emprego”, afirmou.

O deputado pontuou, ainda, que a negociação da proposta consagrou a “arte do diálogo”, pois teve a participação de diversos parlamentares. “Se não fizemos a melhor reforma, estamos fazendo o melhor que pudemos fazer na noite de hoje”, declarou. Para ele, a votação da proposta é “um marco histórico do período democrático brasileiro”.

O que está em jogo?

O texto votado pelos deputados cria um Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) no formato dual, composto por dois tributos: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI) ‒ e pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

O primeiro substituiria três tributos federais: a Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS), a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e o Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI). E o segundo substituiria o estadual Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) e o municipal Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS).

O modelo busca estabelecer uma definição ampla para o fato gerador do novo tributo, sem diferenciação entre produtos e serviços, e garantir a não cumulatividade plena (ou seja, acabar com o chamado “efeito cascata”), com dedução do tributo que incide sobre as operações anteriores, mesmo que indiretamente relacionado à atividade produtiva, em um sistema de crédito financeiro. Também fica estabelecido o regime de cobrança “por fora”, no destino das operações com bens e serviços.

No novo sistema, o IVA dual contará com uma alíquota padrão, outra diferenciada (com redução de 60% em relação à primeira) e uma terceira zerada. Mas não há indicação sobre qual tende a ser o patamar necessário de cobrança no início do funcionamento pleno do novo regime ‒ o que deve ficar para definição apenas na discussão de projeto de lei complementar sobre o assunto.

Eis os bens e serviços listados no segundo grupo:

1) Serviços de educação;

2) Serviços de saúde;

3) Dispositivos médicos e de acessibilidade para pessoas com deficiência;

4) Medicamentos e produtos de cuidados básicos à saúde menstrual;

5) Serviços de transporte coletivo de passageiros rodoviário, ferroviário e hidroviário, de caráter urbano, semiurbano, metropolitano, intermunicipal e interestadual;

6) Produtos agropecuários, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura;

7) Insumos agropecuários, alimentos destinados ao consumo humano e produtos de higiene pessoal; e

8) Produções artísticas, culturais, jornalísticas e audiovisuais nacionais.

Já na faixa de isenção estariam alguns medicamentos (como aqueles destinados ao tratamento de doenças como câncer) e serviços de educação de Ensino Superior ‒ caso do Prouni (Programa Universidade Para Todos).

Também podem ser enquadrados nessa hipótese os produtores rurais pessoas físicas ou jurídicas que obtiverem receita anual inferior a R$ 3,6 milhões, atualizada anualmente pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), e produtores integrados que optarem por ingressar no novo modelo.

Pela lei mencionada, está enquadrado no segundo grupo o produtor agrossilvipastoril, pessoa física ou jurídica, que, individualmente ou de forma associativa, com ou sem a cooperação laboral de empregados, se vincula ao integrador por meio de contrato de integração vertical, recebendo bens ou serviços para a produção e para o fornecimento de matéria-prima, bens intermediários ou bens de consumo final.

O substitutivo também abre a possibilidade para que lei complementar zere, até 28 de fevereiro de 2027, a alíquota do IVA incidente sobre serviços beneficiados pelo Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse).

Há, ainda, uma especificação de setores que contarão com regimes diferenciados de tributação, por terem atividades não-conciliáveis ao modelo do IVA. São eles:

1) Serviços financeiros, operações com bens imóveis, planos de assistência à saúde e concursos de prognósticos: alterações nas alíquotas, nas regras de creditamento e na base de cálculo; e tributação com base na receita ou no faturamento;

2) Operações com bens móveis: autorização para que lei complementar flexibilize as diretrizes padrões do imposto e preveja hipóteses de regime cumulativo e de redução de alíquota e base de cálculo; especifica-se este tipo de operação como a incorporação imobiliária, o parcelamento do solo e alienação de bem imóvel e a locação e arrendamento de bem imóvel.

3) Planos de assistência à saúde e concursos de prognósticos: autorização para que lei complementar preveja hipóteses de cobrança cumulativa com base na receita ou no faturamento e de alteração de alíquota e base de cálculo.

4) Combustíveis e lubrificantes: monofasia, com alíquotas uniformes e possibilidade de concessão de crédito para o contribuinte do imposto;

5) Compras governamentais: não incidência de IBS e CBS, admitida a manutenção dos créditos relativos às operações anteriores; e destinação integral do produto da arrecadação do IBS e da CBS recolhida ao ente federativo contratante, mediante redução a zero das alíquotas dos demais entes e elevação em idêntico montante da alíquota do ente contratante;

6) Sociedades cooperativas: não incidência do imposto sobre as operações realizadas entre a sociedade cooperativa e seus cooperados. E os créditos do imposto serão transferidos entre os cooperados e a sociedade cooperativa.

O texto manteve dois regimes tributários favorecidos estabelecidos na Constituição Federal. São eles: a Zona Franca de Manaus (ZFM) e o Simples Nacional. A manutenção do segundo regime, segundo o relator, preserva 90% das empresas do setor de serviços das mudanças no sistema tributário.

Além da CBS e do IBS, a proposta cria um Imposto Seletivo (IS) que poderá incidir sobre a produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. O rol de itens sujeitos a tal tributação será definido por lei complementar posterior, mas o texto impede a cobrança sobre exportações ou bens e serviços que tenham alíquotas reduzidas.

No novo parecer lido pelo relator, foi mantida previsão para a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR) e do Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais ou Financeiros-fiscais, ambos voltado aos entes subnacionais.

O primeiro caso contempla a entrega de recursos aos Estados e ao Distrito Federal para a aplicação na realização de estudos, projetos e obras de infraestrutura, no fomento a atividades produtivas com elevado potencial de geração de emprego e renda (incluindo a concessão de subvenções econômicas e financiamentos) e a promoção de ações com vistas ao desenvolvimento científico e tecnológico e à inovação.

O substitutivo prevê que os recursos corresponderão aos valores, atualizados, de 2023 até o ano anterior ao da entrega, pela variação acumulada pela inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), da seguinte forma:

1) R$ 8 bilhões em 2029;

2) R$ 16 bilhões em 2030;

3) R$ 24 bilhões em 2031;

4) R$ 32 bilhões em 2032;

5) R$ 40 bilhões em 2033.

Já o Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais ou Financeiros-fiscais tem por objetivo compensar, até 31 de dezembro de 2032, pessoas jurídicas beneficiárias de isenções, incentivos e benefícios fiscais concedidos por governos estaduais e covalidados por legislação aprovada pelo Congresso Nacional.

Neste caso, o texto prevê que a União aporte ao Fundo recursos que corresponderão aos seguintes valores (também atualizados pela variação acumulada pelo IPCA):

1) R$ 8 bilhões em 2025;

2) R$ 16 bilhões em 2026;

3) R$ 24 bilhões em 2027;

4) R$ 32 bilhões em 2028;

5) R$ 32 bilhões em 2029;

6) R$ 24 bilhões em 2030;

7) R$ 16 bilhões em 2031;

8) R$ 8 bilhões em 2032.

Uma lei complementar a ser discutida posteriormente estabelecerá os critérios e limites para apuração do nível de benefícios e de sua redução e os procedimentos de análise, pela União, dos requisitos para habilitação do requerente à compensação mencionada.

Já entre as principais mudanças no novo substitutivo está a criação de uma chamada “cesta básica nacional”, com desoneração completa de tributos sobre os produtos desta categoria. A definição da lista de produtos ficaria para lei complementar posterior.

Na proposta inicial, os produtos da cesta básica, que hoje são isentos de tributos federais, estariam sujeitos à tributação diferenciada, com alíquota de 50% da adotada como referência. Com o novo texto, alguns desses produtos continuariam desonerados para toda a população.

Há, ainda, previsão de um modelo de devolução de imposto a pessoas físicas (mecanismo que ficou conhecido como “cashback”), aplicável a pessoas de baixa renda e grupos menos favorecidos da sociedade, com objetivo de reduzir desigualdades de renda. Os critérios, porém, ficaram para definição por lei complementar.

O texto também inclui dispositivo que prevê que a transição dos IVAs nacional (CBS) e subnacional (IBS) começará ao mesmo tempo, em 2026. Na versão anterior, o segundo iniciaria apenas em 2033.

A transição para o contribuinte também muda. Na versão inicial, o IVA federal começaria em 2026 com alíquota teste de 1%. Agora, os dois IVAs entram em vigor a partir de 2026, com alíquotas de 0,9% no caso do tributo federal e de 0,1% no imposto subnacional.

Os valores arrecadados com o IBS neste primeiro momento serão utilizados para custear o Conselho Federativo, órgão responsável por administrar o tributo de governos estaduais e prefeituras, além de compor o fundo para compensar perdas com o fim de benefícios do ICMS.

No segundo ano, a CBS substituiria totalmente os impostos indiretos federais, enquanto o IBS permaneceria com alíquota teste até 2028, de modo a garantir o financiamento do Conselho Federativo e do Fundo de Compensação de benefícios fiscais. No período entre 2029 e 2032, o IVA subnacional seria introduzido à proporção de 1/10 por ano. E a partir de 2033, os tributos indiretos de estados e municípios seriam totalmente substituídos pelo novo imposto.

Pelo texto, o IVA subnacional terá legislação única aplicável em todo o território nacional, mas cada ente federativo fixará sua alíquota própria por lei específica. Uma vez definida, essa alíquota será a mesma para todas as operações com bens ou serviços, ressalvados os regimes diferenciados ou categorias que contem com alíquotas reduzidas delimitados na própria proposta.

Um dos pontos mais sensíveis da discussão, o Conselho Federativo que administrará e distribuirá os recursos arrecadados com o IBS (ou seja, o IVA subnacional) também sofreu modificações durante sua tramitação, com o relator acatando a sugestões construídas por governadores. Um dos nomes mais vocais nesta discussão foi o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).

O texto prevê que os 26 estados e o Distrito Federal terão um representante cada, enquanto os municípios e o próprio DF serão representados por outros 27 membros ‒ 14 eleitos com base nos votos igualitários desses entes e 13 com base nos votos ponderados pelas respectivas populações.

Quanto às deliberações do órgão, serão aprovadas as matérias que obtiverem, cumulativamente, os votos da maioria absoluta dos representantes de cada unidade da federação e de representantes que correspondam a mais de 60% da população do País. Além disso, será necessário o aval da maioria absoluta dos representantes do segundo grupo, formado pelo DF e o conjunto de municípios.

São competências do conselho previstas na proposta: 1) editar normas infralegais sobre temas relacionados ao imposto, de observância obrigatória por todos os entes; 2) uniformizar a interpretação e a aplicação da legislação do imposto, que serão vinculantes; 3) arrecadar o imposto, efetuar as compensações e distribuir o produto da arrecadação entre estados, Distrito Federal e municípios; 4) dirimir as questões suscitadas no âmbito do contencioso administrativo tributário entre o sujeito passivo e a administração tributária.

O texto apresentado também avançou sobre matérias que vão além dos chamados impostos indiretos e trouxe determinação de que a segunda etapa da reforma, que tratará dos impostos sobre a renda, seja encaminhada ao Congresso Nacional em até 180 dias da promulgação da Emenda Constitucional e que o aumento de arrecadação obtida com ela seja utilizado para reduzir a tributação incidente sobre a folha de pagamentos e sobre o consumo de bens e serviços.

O substitutivo prevê a cobrança de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) sobre veículos aquáticos e aéreos e a possibilidade de o tributo ser progressivo de acordo com a função, o valor, a utilização e o impacto ambiental. Ficam de fora da cobrança: 1) aeronaves agrícolas e de operador certificado para prestar serviços aéreos a terceiros; 2) embarcações de pessoa jurídica que detenha outorga para prestar serviços de transporte aquaviário ou de pessoa física ou jurídica que pratique pesca industrial, artesanal, científica ou de subsistência; 3) plataformas suscetíveis de se locomoverem na água por meios próprios; e 4) tratores e máquinas agrícolas.

No caso do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), estabelece regra de progressividade em razão do valor de transmissão, incluiu a possibilidade de cobrança sobre heranças no exterior e transferiu a competência do imposto sobre bens móveis, títulos e créditos ao Estado onde tiver domicílio o de cujus.

Atendendo a uma demanda de prefeitos, o texto incluiu dispositivo que autoriza que o Poder Executivo local atualize a base de cálculo do imposto por meio de decreto a partir de critérios gerais previstos em lei municipal, sem necessidade de deliberação por Câmara de Vereadores.

Em outro aceno aos prefeitos, o texto também trouxe dispositivo que autoriza os municípios e o DF a instituir contribuição para o custeio, expansão e melhoria do serviço de iluminação pública.

Fonte: Infomoney



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