Busca por mais equilíbrio entre vida pessoal e profissional tem determinado comportamentos e escolhas, gerando impactos tanto na produtividade quanto no clima organizacional.
A ideia de crescimento profissional não é a mesma para todo mundo e, entre diferentes gerações, essa percepção pode até mesmo contrariar os modelos de trabalho vigentes. É o que tem sido evidenciado por fenômenos como o quiet quitting (demissão silenciosa) e o quiet ambition (ambição silenciosa).
O termo quiet quitting descreve a conduta de um colaborador desengajado. É mais do que não “vestir a camisa”: ele não acredita na cultura das empresas e cumpre suas tarefas e metas passivamente, simplesmente executando o que foi solicitado.
“É uma postura de baixa iniciativa, onde ele tenta fazer o mínimo possível para atender o que se espera dele”, explica o fundador da FairJob e especialista em gestão humanizada, Charles Beck Varani. “É algo que sempre existiu, mas agora, devido aos contrastes geracionais e novos modelos de trabalho remoto, está mais evidente”.
Por trás da demissão silenciosa estão fatores que provocam o desengajamento, como o não atendimento das expectativas de cultura, carreira ou salário combinadas entre o colaborador e a empresa. “Muitas vezes, o colaborador se demite da liderança, não da empresa, e isso está conectado a questões culturais e de propósito que se desencontraram”, pondera Varani.
Já o quiet ambition retrata uma característica das novas gerações, que não desejam assumir cargos de liderança e que evitam a ambição típica dos baby boomers, geração que chegava ao mercado de trabalho nos anos 1980. “As gerações Y e Z, e até as mais novas,
percebem o impacto negativo das posições de liderança na saúde mental e querem evitar esse caminho”, comenta Varani. Nesse caso, a questão é que as dinâmicas de trabalho já não são atrativas o suficiente para despertar o desejo de crescimento nos colaboradores.
Comportamentos como esses podem comprometer tanto o desempenho individual quanto o coletivo. “As pessoas não estão se esforçando ou se empenhando nos objetivos da empresa, mas sim trabalhando no limite mínimo de produtividade. Isso pode contaminar o ambiente, fazendo com que outros colaboradores questionem se seus esforços valem a pena”, considera Varani.
Em busca do equilíbrio
O contexto atual exige das empresas uma compreensão das dinâmicas de trabalho em comparação com as percepções dos colaboradores. Só assim será possível enfrentar as causas do problema.
“Uma das potenciais razões que explicam o quiet ambition é uma preocupação sobre balanço vida pessoal-trabalho”, frisa a professora associada de Comportamento Organizacional e Liderança no Insper, Tatiana Iwai.
Alcançar posições mais elevadas na hierarquia das empresas pode significar mais dificuldade para conseguir esse equilíbrio. “E o que a gente vai percebendo agora e que se agrava com a pós-pandemia é que as pessoas hoje estão mais preocupadas com a vida pessoal e, talvez, estejam menos dispostas a abrir mão disso pela carreira”, observa a professora.
Quanto ao quiet quitting, Iwai destaca dois fatores que influenciam o engajamento: “Ou as demandas de trabalho são muito altas ou os recursos que você tem de trabalho para atender essas demandas não são suficientes”. É preciso analisar essas variáveis para criar uma estratégia que contorne o problema.
Os recursos devem ser entendidos como todos os meios de suporte oferecidos para que o trabalhador consiga desempenhar bem suas funções. Isso engloba coisas como oportunidades de carreira ou desenvolvimento, apoio de lideranças e pessoas, recompensas (benefícios atrativos), sistemas de avaliação claros, entre outros pontos. “Todas essas coisas fazem parte dos recursos de trabalho que a gente sabe, por meio de várias pesquisas empíricas, que têm
um efeito fortíssimo em engajamento do profissional”, atesta.
“O que as organizações podem fazer, nesse caso, é realmente refletir e avaliar até que ponto elas estão provendo recursos necessários e um ambiente que consiga prover esses instrumentos na mesma medida em que o trabalho é demandado”, esclarece. Como identificar isso? Por meio de pesquisa de clima organizacional, sugere a professora. A pesquisa de clima permite que a empresa compreenda todas as experiências do colaborador no trabalho. “Então ela avalia os sistemas de recompensas, avaliação, relações sociais, oportunidade de crescimento, relação com as lideranças, etc.”. E, a partir desse “retrato”, é possível criar um plano de ação.